SUCESSÃO EMPRESARIAL

Data: 29/05/2024     Categoria: Informativo     Autor: FLAVIO BOMFIM

Em decisão proferida em Incidente de Desconsideração da Personalidade Jurídica (IDPJ), com atuação do  Advocacia Bomfim, o Juiz da 29ª Vara Cível do Foro Central da Comarca de São Paulo/SP (processo n° 003734) reconheceu a sucessão fraudulenta e direcionou a ação de execução contra todas as empresas, e respectivos sócios, envolvidos na continuação das atividades da devedora.

Em resumo, restou demonstrado no processo que a devedora principal – produtora e distribuidora de reconhecida marca de laticínios – encerrou suas operações sem que houvesse patrimônio para saldar as dívidas contraídas e teve suas atividades continuadas por outras três empresas, mantendo as unidades gerenciais, laborativas e patrimoniais.

A empresa de factoring credora, por meio da equipe de recuperação de créditos da Advocacia Bomfim, identificou que o principal produto da devedora, embora mantido em nome dela, passou a ser produzido e comercializado pelas sucessoras com participação de membros da mesma família, fatos, inclusive, confirmados em reclamações trabalhistas movidas pelos funcionários do grupo empresarial. Foram motivos suficientes para a inclusão de todas as empresas, e respectivos sócios, no polo passivo da ação de execução.

Esta foi a decisão:

“Vistos. Trata-se de incidente de desconsideração da personalidade jurídica objetivando a exequente a inclusão no polo passivo da execução de K. COMERCIO DE PRODUTOS ALIMENTÍCIOS EIRELI, LATICINIOS O. INDUSTRIA E COMERCIO LTDA, L. COMERCIO, IMPORTAÇÃO E EXPORTAÇÃO LTDA, A. M. DE O., A. R. R., A. DE O., C. A. DA S. O. e N. R. JR.

Discorre que a marca KEIJOBON, popularmente conhecida e produzida pela executada, permanece em atividade e circulação a despeito da situação INAPTA da devedora perante a Receita Federal. Atribui conluio na sucessão entre as empresas K., Laticínios O. e L.. Aponta a participação dos filhos do sócio da executada no quadro social de referidas empresas. Atribui confusão patrimonial, desvio de finalidade e sucessão empresarial. É o relatório.

A desconsideração da personalidade jurídica e o consequente direcionamento da execução contra os sócios ou empresa devedora é medida excepcionalíssima, a ser aplicada somente em face da constatação de fraude, desvio de finalidade, mau uso e/ou desvirtuamento da função da pessoa jurídica.

O ordenamento jurídico brasileiro adotou e positivou a teoria da desconsideração da personalidade jurídica com a finalidade de responsabilizar os sócios por abusos praticados pela sociedade empresária (desconsideração direta) ou responsabilizar a sociedade empresária por abusos praticados por seus sócios (desconsideração indireta ou inversa).

O art. 50 do Código Civil, com as alteração da Lei nº 13.874/2019 dispõe: Art. 50. Em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade ou pela confusão patrimonial, pode o juiz, a requerimento da parte, ou do Ministério Público quando lhe couber intervir no processo, desconsiderá-la para que os efeitos de certas e determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos bens particulares de administradores ou de sócios da pessoa jurídica beneficiados direta ou indiretamente pelo abuso. § 1º Para os fins do disposto neste artigo, desvio de finalidade é a utilização da pessoa jurídica com o propósito de lesar credores e para a prática de atos ilícitos de qualquer natureza. § 2º Entende-se por confusão patrimonial a ausência de separação de fato entre os patrimônios, caracterizada por: I – cumprimento repetitivo pela sociedade de obrigações do sócio ou do administrador ou vice-versa; II – transferência de ativos ou de passivos sem efetivas contraprestações, exceto os de valor proporcionalmente insignificante; e III – outros atos de descumprimento da autonomia patrimonial.

Releva-se, portanto, que a desconsideração da personalidade jurídica somente pode ocorrer de forma excepcional, na medida em que autoriza a superação da autonomia patrimonial da pessoa jurídica para determinar a responsabilização dos seus sócios pelas obrigações inadimplidas, quando ocorridas as situações previstas no art. 50, do Código Civil. Infere-se que este instituto incide em situações pontuais, em que fique claramente caracterizado um dos pressupostos contidos no referido artigo.

Embora o decreto da medida seja de extrema exceção, diante dos indícios de encerramento irregular das atividades da executada e consequente transformação em nova empresa, sem deixar bens passíveis de garantir suas dívidas e estando presentes os requisitos autorizadores da incidência da teoria da desconsideração da personalidade jurídica, tem-se, no caso em apreço, os pressupostos do artigo 50 do Código Civil.

Os elementos apontados no incidente revelam o esvaziamento patrimonial da empresa devedora principal, com a manutenção de suas atividades por intermédio de outras pessoas jurídicas, no mesmo grupo familiar. Restou evidenciada a existência de sucessão empresarial e de confusão patrimonial, especialmente com a continuidade da marca e produto “KEIJOBON”, renovada em 2019. Tais fatos, evidenciam o uso abusivo da personalidade jurídica, pelo encerramento irregular das atividades da empresa devedora principal, sem que houvesse patrimônio para saldar as dívidas contraídas e pela continuação de suas atividades empresariais por intermédio de outras empresas.

Dispositivo. Diante do exposto, JULGO PROCEDENTE o incidente para incluir no pólo passivo da execução K. COMERCIO DE PRODUTOS ALIMENTÍCIOS EIRELI, LATICINIOS O. INDUSTRIA E COMERCIO LTDA, L. COMERCIO, IMPORTAÇÃO E EXPORTAÇÃO LTDA, A. M. DE O., A. R. R., A. DE O., C. A. DA S. O. e N. R. JR.”

A sucessão empresarial é prática comum adotada por alguns grupos devedores e requer minucioso trabalho de identificação da fraude. A equipe de recuperação de crédito da Advocacia Bomfim tem obtido sucesso nesse tipo de trabalho.